segunda-feira, 22 de março de 2010

4;SUICIDIO NO BRASIL

No Brasil, apesar da pouca confiabilidade dos dados e dos parcos recursos destinados à sistematização de uma boa coleta, a Fundação Nacional de Saúde computou 6.594 casos no território nacional, em 1995, sendo a maior taxa entre a população de 20 a 39 anos (FNS, 1988). Mas, segundo Mello Jorge (1995), o suicídio é a mais passível de subestimação entre as causas externas.

Somente no município de São Paulo foram 5,2:100.000 no ano de 1991. Chama atenção a sua ocorrência entre adolescentes e o pico entre 20 e 24 anos (Gawryszewski, 1995). Mas essa taxa também deve estar sujeita a sub-registro, principalmente das mortes por envenenamento (Allebeck et al., 1991).

Na etnologia brasileira, parece que o hábito já era comum entre os Guarani-Apapokuva e os Urubu-Kaapor em meados deste século. Mas, apesar das descrições de casos esparsos posteriormente, em vários grupos, como os Paresi, os Yanomami (dal Poz, 1999) e os Ticuna (nestes últimos, com uma taxa de 28% do total de óbitos entre 1994 e 1996) (Erthal, 1998), a questão somente veio à tona após o destaque dado pela imprensa leiga à “epidemia” ocorrida entre os Guarani, nas proximidades do município de Dourados (MS), a partir da década de 1980.

No seu ano mais crítico, em 1995, foram 55 casos fatais para uma população de 25,5 mil habitantes (CIMI, 1996). Esse valor equivaleria a uma taxa de 215,7:100.000, cerca de 40 vezes a média bra-si-leira. O caráter seqüencial e, novamente, a predominância entre os adolescentes eram chamativos (Cassorla e Smeke, 1994; Levcovitz, 1998).

A situação mais crítica já descrita está entre o grupo indígena Sorowahá, do ramo lingüístico Arawá (ou aruaque). Tem uma população estimada em 130 habi-tantes, pelo último censo brasileiro de 1997, e ocupa uma área demarcada próximo ao município de Tapauá (AM), na região do Médio Purus, importante rio da Bacia Hidrográfica Amazônica (IBGE, 1997). Vivem ainda da agricultura de subsistência, caça, pesca e coleta (Kroemer, 1985).

Afastados das principais vias de navegação, esses índios mantiveram seu isolamento até o fim da década de 1970, quando foram localizados pelas notícias de conflitos com sorveiros (caboclos que vivem do extrativismo da sorva, fruto babáceo comestível da sorveira), que haviam invadido seu território.
Desde os primeiros contatos, em 1980, os indigenistas depararam-se com tentativas de suicídio freqüentes, através do envenenamento pela ingesta do sumo da raíz de um tipo de timbó (o konaha – provavelmente uma leguminosa do gênero lonchocarpus, cujo princípio ativo é a rotenona).

Através de um levantamento genealógico, que remontou até seis gerações passadas, foram reportados 122 casos (75 homens e 47 mulheres) anteriores à data do primeiro contato, em 1979, e 38 casos (18 homens e 20 mulheres) de 1980 a 1995. Em todos os períodos, os indivíduos eram, majoritariamente, jovens entre 14 e 28 anos (Tabela 2).

Amostras de extensão reduzida e eventos de baixa freqüência impõem cautela no manuseio de dados demográficos nas sociedades de pequena escala (Adams e Price, 1994). Mas, tomando-se a população Sorowahá, com uma média estimada em 123,6 pessoas para o último período, de 1980 a 1995, as cifras corresponderiam a uma projeção aritmética de 1.922 casos para 100 mil habitantes, quase 10 vezes o valor estimado para os Guarani (dal Poz, 1999).

Mesmo com números tão alarmantes, caminhando talvez para o auto-extermínio, esse grupo foi objeto apenas de estudos preliminares no campo da etnografia e da lingüística, de teor mais descritivo (Kroemer, 1985; 1989; 1994; Silva, 1994; Suzuki, 1995; Fank e Porta, 1996).


Conclusão


Os estudos realizados entre as populações de nativos em vários lugares do mundo (no Brasil esse tipo de trabalho ainda tem sido escasso) apontam invariavelmente para a importância dos fatores de risco vinculados à psicopatologia, além daqueles ligados aos aspectos socioeconômicos e culturais.

Na medida em que o suicídio pode ser explicado como expressão da psicopatologia, suscetível à intervenção, estaríamos diante da ocorrência de mortes potencialmente evitáveis. Uma revisão recente dos estudos sobre suicídio sugere que a melhoria do diagnóstico e do tratamento das doenças mentais seria uma excelente estratégia para a prevenção de novos casos na população geral (Henriksson et al., 1993; Mortensen, 1999).

Estamos então diante de uma problemática na qual se salienta a necessidade da disposição de programas preventivos e de tratamento, elaborados por profissionais de saúde mental (Desjarlais, 1997).

Contudo, há que se considerar sempre a especificidade que cada grupo impõe para si. Daí a necessidade de mais pesquisas para a produção de dados particularizados na área da suicidologia, visando relevância cultural e sociológica na fundamentação das estratégias de prevenção e assistência em saúde mental (Santora e Starkey, 1982).



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